domingo, 1 de dezembro de 2013

Blue Jasmine

Não me lembro há quanto tempo eu não saio sozinha. De decidir com antecedência, escolher o evento, pesquisar horário, local... Acho que da última vez eu ainda era solteira. Talvez em Londres, quando eu fui assistir ao musical Chicago. Não é que eu não queira sair com outras pessoas. Mas é difícil encontrar uma amiga para ir ao cinema. As pessoas querem sair para tomar um chope. Convite para cinema é coisa rara. Mais ainda se você nao gosta de assistir superproduções.
Por isso, quando eu vi o anúncio do novo filme do Woody Allen, em cartaz só no Rio, decidi não esperar nem mais um dia. Escolhi um horário que me permitiria sair do cinema e ver o entardecer (horário que me deixa mais reflexiva, complementar ao pós filme). Não foi simples me programar para isso. Não é como sair de casa para ir ao cinema sozinha. Esperem... Rafa trabalhando. Arrumei as malas e a criança e tomei um ônibus de Rio das Ostras até Niterói. Deixei a pequena com a minha mãe após uma boa sessão de leite materno. Tomei um ônibus até a praia de Icaraí e dali, outro para Botafogo. Adoro passear por bairros antigos. Eu me encanto com a arquitetura contrastante dos prédios do centro do Rio. A beleza dobrada das construções antigas repetindo-se nas janelas espelhadas das edificações modernas. Depois os bairros residenciais. Gosto de olhar para dentro das janelas e imaginar como é a vida de quem mora ali. Pelos móveis dispostos, pelas cortinas desbotadas, pelos lustres de cristal demodês ou pelo lusco-fusco das lâmpadas incandescentes, tento adivinhar quais foram as conquistas de seus moradores, suas mazelas, o que lhes dói ou lhes constrói. Acho que entendo a curiosidade que impulsionou os diretores de Edifício Master e Um lugar ao Sol.
Alguns destes edifícios estão completamente vazios. As janelas bem antigas, que não se abrem por completo, guardam poeiras e estórias nas suas frestas. O vidro ainda se conserva. Papel de parede, sanca e gradil. O que houve, afinal? Foi tombado pelo patrimônio histórico? Ou interditado pela defesa civil?
Rafa costuma dizer que eu tenho um GPS acoplado. Não que eu seja assim, uma taxista! rsrsr Mas, diferente do meu marido, que presta atenção às pessoas (e não perde um par de pernas), eu gosto de observar as janelas. E dali eu reconheço os nomes dos prédios, descubro padarias, casas de antigos barões, uma tinturaria, uma padaria, uma árvore torta. Vou criando referências fixas.
Pois bem, voltemos ao filme. Ele é sempre igual, Woody Allen. Uma comédia romântica, que parece mais um água com açúcar qualquer. Mas entruncado. Complexo, emaranhado. O tragicômico da vida privada. A sutileza na fotografia do cotidiano. A condição reflexiva de alguns. Poucos. (E a sala quase vazia) E quando termina você está se lembrando das aulas de filosofia (em algum momento recordei Quem tem medo de V.Wolf). De Sócrates, Nietzsche, Foucault, da moral judaico-cristã e etcetera e tal.
Permaneci sentada para me inebriar um pouco mais com a música. E pouco a pouco, vi a platéia retirar-se. E vi as mulheres de Woody Allen. Sozinhas, acompanhadas, altivas, cabisbaixas. Gordas ou magras, maquiadas ou não. Eram elas, eu vi.
Terminaram os créditos. Eu também me levantei. Era mais uma. A última a sair. Cabelos desgrenhados, volmosos. O corpo magro, espelho do que bebês fazem com as mães em seus primeiros meses de vida. Restou um casal de meia idade no fundo. Que tipo de gente fica até depois de os créditos já terem terminado? Ficaram me observando sair. Imaginei que só podiam ser eles. Woody Allen e Soon-Yi. Quem mais?

Nenhum comentário:

Postar um comentário